Uma das manifestações que melhor retratam a africanidade baiana, o Desfile de Afoxés, ou Cortejo de Afoxés, como também é chamado, foi reconhecido como patrimônio cultural imaterial da Bahia. O decreto estadual, assinado pelo governador Jaques Wagner na segunda-feira (29), foi festejado pelos representantes dos afoxés nesta terça (30), durante cerimônia de divulgação, no Palácio da Aclamação, no Campo Grande.
Para o presidente da Associação de Afoxés da Bahia, Nadinho do Congo, a história ganha um importante reforço com o reconhecimento. “Olorum nos abençoou com vitória nesta luta, onde há muitos anos a elite não permitia que os negros tivessem acesso ao Carnaval. Existem afoxés no Rio de Janeiro, Fortaleza e Pernambuco, mas a Bahia sai na frente. Estamos todos de parabéns. Nossa história daqui pra frente estará mais forte”, destacou Nadinho.
O Afoxé Kambalagwanze, com sede no bairro do Barbalho, possui aproximadamente mil associados. A presidente da instituição, Iracema Neves, explicou que os trabalhos sociais desenvolvidos com a comunidade também ganham com o reconhecimento. “Durante muito tempo, o segmento afoxé passou por um processo de desgaste muito grande, em função da falta de apoio do governo a esta manifestação de matriz africana na Bahia. Com essa decisão de tornar o afoxé patrimônio imaterial, acreditamos numa reparação. Sem contar na respeitabilidade, dignidade e credibilidade do segmento”, observou Iracema.
Além da secretária estadual de Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza, Arany Santana, representantes de terreiros, afoxés, blocos afros, imprensa e classe política, a cerimônia de divulgação do decreto reuniu professores e historiadores, a exemplo do presidente da Fundação Pedro Calmon, Ubiratan Castro.
“É um grande incentivo a esta modalidade cultural afro-brasileira, que sempre foi vista como uma atividade menos importante, que jamais se emparelhou, em termos de prestígio, com os blocos afros. Os afoxés são o candomblé na rua. É a voz do povo negro pela liberdade. Registrá-lo como patrimônio cultural imaterial permite uma maior segurança àqueles que integram esses grupos. E o mais importante, abre um caminho legal para que o Estado possa apoiar financeiramente”, declarou Ubiratan.
O Afoxé Filhos de Gandhy, que já foi reconhecido pelo Livro dos Recordes (Guiness Book) como maior afoxé do mundo, celebra a nova conquista. “Precisávamos ser reconhecidos para ter mais valor”, disse o presidente da agremiação, Agnaldo Silva.
No evento, o secretário estadual de Cultura, Márcio Meirelles, representou o governador Jaques Wagner. Meirelles explicou que o processo de inclusão do Cortejo de Afoxés na lista de patrimônios imateriais partiu de um principio básico: a relevância cultural. “Os afoxés são parte da construção de um processo histórico, são um objeto identitário, a identidade negra do Carnaval. Essa identidade faz deles um patrimônio. O reconhecimento foi um processo lógico”, ressaltou Meirelles.
O diretor-geral do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (Ipac), Frederico Mendonça, explicou que o início dos trâmites para a elaboração do documento apresentado aos conselheiros de cultura e ao governador partiu de uma demanda apresentada pela maior entidade de afoxé. “Recebemos uma solicitação dos Filhos de Gandhy, no sentido de avaliarmos a possibilidade de reconhecer o Cortejo de Afoxés. A partir disso começamos a realizar estudos históricos e antropológicos para construir o dossiê encaminhado ao conselho”, afirmou Mendonça.
Ofício dos Vaqueiros e Palácio da Aclamação
Frederico Mendonça revelou ainda que o Ofício dos Vaqueiros e o Palácio da Aclamação também tiveram a aprovação do Conselho Estadual de Cultura para se tornarem patrimônios da Bahia. A homologação deve acontecer no início do próximo ano pelo Poder Executivo Estadual. “O vaqueiro é uma figura muito emblemática da nossa cultura. Este é um dos reconhecimentos, depois da Festa de Santa Bárbara, da Festa da Boa Morte e do Carnaval de Maragojipe”, disse o diretor-geral do Ipac.
Lançamento de obras
Durante o evento, também foram lançadas obras que reafirmam a influência da cultura africana no Carnaval, a exemplo do candomblé, e marcam o encerramento das atividades do Mês da Consciência Negra – o livro e o DVD-documentário Desfile de Afoxés e do CD Corredor Midiático. Os trabalhos foram viabilizados por iniciativa da Secretaria Estadual de Cultura, por meio do Ipac e do Instituto de Radiodifusão Educativa da Bahia (Irdeb).
A secretária estadual de Promoção da Igualdade, Luiza Bairros, ressaltou que “esse reconhecimento tem que ser lido e interpretado como parte da nossa luta contra a intolerância religiosa. Os afoxés fazem valer as influências que o candomblé tem sobre nosso povo”.
Publicada às 10h45
Atualizada às 14h50